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Trocar cigarro por cigarro eletrônico ou cigarro de tabaco aquecido não é estratégia de saúde pública comprovada ou segura para parar de fumar, dizem SBPT e SPP

As Sociedades Brasileira e Portuguesa de Pneumologia e Tisiologia (SBPT e SPP) alertam com preocupação que a decisão do Ministro da Saúde da Inglaterra, Neil O’Brien, de distribuir kits gratuitos contendo cigarro eletrônico para um milhão de fumantes no país não é uma estratégia de saúde pública comprovada nem segura para diminuir a elevada carga de doença e morte prematura causada pelo tabagismo de cigarros combustíveis.

A campanha “swap to stop” (“trocar para parar”) foi anunciada por O’Brien em discurso no Policy Exchange, na terça-feira (11/04). De acordo com o Ministro de Saúde Inglês, “vaporizar” seria uma “ferramenta poderosa” para ajudar as pessoas a parar de fumar e, junto com iniciativas de prevenção à iniciação ao fumo, contribuiria para zerar as taxas de tabagismo na Inglaterra até 2030.

A posição das autoridades de saúde inglesas não segue as boas práticas da Medicina baseada em evidências científicas e da ética médica “primum non nocere”, ou seja, “primeiro não prejudicar”. Não segue também o princípio de precaução de saúde pública, já que existe farta documentação científica dos prejuízos à saúde causados por estes produtos.

Os cigarros eletrônicos não são nem dispositivos médicos nem medicamentos, são produtos de consumo banidos em mais de 40 países, entre eles, o Brasil, que fornecem nicotina inalada além de outras quase 2 mil substâncias. Já foram identificados compostos tóxicos, irritantes e até carcinogênicos, muitos deles, não especificados pelos fabricantes.

“Esses aparelhos também oferecem perigos específicos, como o vazamento de metais pesados no filamento aquecido, aumentando o risco de câncer, adoecimento por síndrome respiratória aguda e explosão do dispositivo, por exemplo. Portanto, não existe o uso ‘terapêutico’ alardeado pela indústria e pelo governo britânico”, ressalta o pneumologista Paulo Corrêa, coordenador da Comissão Científica de Tabagismo da SBPT. “Como esses dispositivos fornecem nicotina, que causa grande dependência, e outros produtos tóxicos, os usuários acabam persistindo no uso continuado, podendo sofrer os efeitos negativos na saúde e adoecer”, complementa a Dra. Sofia Ravara, presidente da Comissão de Tabagismo da SPP.

Por outro lado, os tratamentos da dependência do tabaco são clinicamente eficazes, seguros e muito custo-efetivos em comparação com outras intervenções médicas.  A melhor maneira de parar de fumar é uma combinação de aconselhamento comportamental e farmacoterapia. A associação desses métodos é mais eficaz do que qualquer um deles isoladamente. Portanto, os profissionais de saúde devem incentivar todos os fumantes a fazer uma tentativa de cessação do tabagismo usando aconselhamento médico e medicação. Enquanto os sistemas de saúde devem apoiar os profissionais de saúde na disponibilização e integração desses tratamentos eficazes ao nível do sistema de saúde, com um custo financeiro acessível para os fumantes.

De maneira preocupante, a indústria do tabaco e dos cigarros eletrônicos tem usado um marketing contundente e difícil de controlar, por meio de influenciadores digitais nas redes sociais, para promover o tabaco aquecido e os dispositivos eletrônicos para fumar (DEF) como seguros e eficazes na cessação do tabagismo.

“Diversos estudos epidemiológicos em diferentes países, desde a América do Norte e do Sul até à Europa e Ásia, têm mostrado uma experimentação e consumo crescente desses produtos entre a população, sobretudo nos adolescentes e adultos jovens. Na Europa, os inquéritos do Eurobarômetro revelam uma tendência decrescente da cessação assistida pelos cuidados de saúde, enquanto parar de fumar sem assistência médica ou usando os cigarros eletrônicos tem crescido. Essas tendências são estarrecedoras e resultantes do marketing enganador da indústria”, pontua a Dra. Ravara.

“A ciência já comprovou que os cigarros eletrônicos não ajudam quem está tentando parar de fumar a fazê-lo. Na revisão sistemática e meta-análise ‘E-cigarettes and smoking cessation in real-world and clinical settings’, publicada por Kalkhoran e Glantz na revista científica The Lancet Respiratory Medicine, pessoas que tentaram parar de fumar cigarro convencional utilizando cigarros eletrônicos tiveram 28% menos chance de sucesso do que os que não utilizaram esses dispositivos”, comenta o pneumologista Dr. Paulo Corrêa.

Segundo o especialista, muitos estudos que supostamente comprovam que esses dispositivos ajudam a parar de fumar têm conflitos de interesse, além de problemas de metodologia e execução.

“Não existe cigarro bonzinho”, alerta o Dr. Paulo Corrêa. “Se você nunca tiver fumado cigarros, não inicie o uso de produtos de tabaco aquecido nem de DEFs. Se você está utilizando um ou mais desses produtos, saiba que o processo de parar de fumar é a melhor ação que você poderá fazer pela sua saúde. O tratamento com um profissional habilitado inclui avaliação e atuação em múltiplos fatores, como o estabelecimento do perfil comportamental do paciente, a presença ou não de doenças causados pelo tabagismo/nicotismo, e sua gravidade, o grau de dependência de nicotina, entre outros. O tratamento envolve um plano de ação definido junto com o paciente, caso a caso, com técnicas de relaxamento e de manejo de fissura e, quando indicado, acompanhamento psicológico e terapia medicamentosa, incluindo reposição de nicotina e/ou uso da bupropiona ou da citisina (disponível em Portugal), que atuam nas vias cerebrais da dependência”, explicam os pneumologistas.