1. No Brasil, consta já na Constituição Federal de 1946, os presidentes da República cumprem juramento à Nação, quando da posse. Comprometem-se, entre outros pontos, a “promover o bem geral do povo”. Voto, naturalmente, extensivo a todos os membros de Governo.
2. O Código de Ética Médica do Brasil estabelece em seu capítulo Princípios fundamentais: “O alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional”.
Assim, o mínimo que os brasileiros esperam de um ministro de Estado da Saúde é que seja fiel à Constituição, assegurando o estabelecido em seu artigo 196: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.
Se o ministro de Estado da Saúde é um médico, como ocorre com o dr. Marcelo Antônio Cartaxo Queiroga Lopes, os brasileiros aspiram que respeite o Código de Ética da Medicina.
Hoje, entretanto, o ministro da Saúde age à margem das mais simples normas de conduta e preceitos éticos esperados para a função. Esta é a avaliação do Comitê Extraordinário de Monitoramento da Covid-19 da Associação Médica Brasileira (CEM COVID_AMB). Os fatos são contundentes e, mais ainda, preocupantes. Destacamos alguns deles:
• O ministro colocou-se contra o uso obrigatório de máscaras, em agosto de 2021. No fim daquele mês, tínhamos média móvel notificada de 671 mortes diárias por Covid e o total se aproximava de 580 mil óbitos;
• Em setembro de 2021, o Ministério da Saúde recomendou a paralisação da imunização de jovens entre 12 e 17 anos sem comorbidades. Na ocasião, o ministro classificou a vacinação de adolescentes como “intempestiva” e admitiu que a revisão da medida atendia a pedido do presidente da República;
• Já em outubro, fez uma de suas repetidas defesas da aplicação do ineficaz “kit Covid”, sob a insustentável tese de que era questão de autonomia médica.
A verdade é que a utilização de tratamentos já comprovadamente ineficazes pela ciência não é autonomia e, sim, má prática médica;
• Em dezembro, enquanto todos os estudos asseguravam a eficácia da vacina em crianças de 5 a 11 anos e o CEM COVID_AMB apontava a relevância da imunização, o Ministro postergava. Afirmava não haver urgência e criava empecilhos, inclusive buscando condicioná-la à obrigatoriedade de prescrição médica, resistência esta que se estendeu até recentemente;
• Em sua cruzada contra vacinas, o ministro defendeu e realizou uma desnecessária e contraproducente consulta pública sobre imunização de crianças de 5 a 11 anos, visando atrasar o processo de vacinação;
• Em janeiro de 2022, dados pessoais de especialistas que defenderam a vacinação em crianças de 5 a 11 anos, em audiência pública, foram vazados em redes sociais, deflagrando ataques e ameaças aos cientistas e seus familiares. O ministro Queiroga, por sua vez, responsável pelos dados fornecidos ao Ministério da Saúde, declarou que não era fiscal de dados;
• Na semana passada, o ministro da Saúde visitou, em São Paulo, família de criança que apresentou parada cardíaca em evento não relacionado à vacina – ainda que aplicada doze horas antes. Independentemente da intenção do ministro, a atitude contribui para relacionar o fato ao emprego do imunizante, trazer dúvidas com relação à sua segurança e promover hesitação vacinal. Desde quando tomou posse, em abril de 2021, em nenhuma outra oportunidade, consta ter visitado, com a mesma divulgação, familiares de crianças que foram à óbito por complicações da COVID-19;
• Na sexta-feira passada, 21 de janeiro, em atitude inédita e com repercussões futuras imprevisíveis e nefastas, o Ministério da Saúde, em nota técnica, desqualificou irresponsavelmente e em negativa às evidências da Ciência – as recomendações aprovadas para o tratamento ambulatorial e hospitalar da Covid-19 pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (CONITEC);
• Na mesma nota técnica, o Ministério da Saúde sustenta que a hidroxicloroquina é eficaz e segura. De gravidade extrema, a nota ainda classifica as vacinas contra Covid como medidas sem comprovação de efetividade e não seguras, contrariando a todas as evidências científicas, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Anvisa, as sociedades médicas nacionais, as internacionais e a Organização Mundial de Saúde (OMS).
Há diversos outros exemplos de erros de conduta e deslizes éticos perpetrados pelo ministro da Saúde nesses nove meses de gestão em meio à pandemia da Covid-19. Entre eles, o apagão de dados epidemiológicos em momento crucial, sem esforços efetivos para pronta resolução do problema.
Vivemos dias de gravidade ímpar no sistema de saúde do Brasil, enquanto o ministro da Saúde desperdiça tempo, endossa tratamentos ineficazes e protela a vacinação.
Causa-nos indignação e temor a omissão, as idas e vindas do ministro, assim como posições que contradizem as boas evidências científicas, expondo a saúde e a vida dos brasileiros.
O Brasil está em alerta e pede mudanças na gestão da saúde. Nós, do grupo CEM COVID_AMB, conclamamos ao senhor Ministro a cumprir os preceitos constitucionais que lhe cabem no exercício de sua nobre missão.
São Paulo, 23 de janeiro de 2022.
Download PDF – Boletim 06/2022 – Conduta do ministro da Saúde no enfrentamento à Covid-19